Justiça nega recálculo de IPTU a shopping center de Presidente Prudente em meio a medidas restritivas de enfrentamento da pandemia
O juiz da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Presidente Prudente (SP), Darci Lopes Beraldo, julgou improcedente um mandado de segurança que pedia o recálculo, em razão dos impactos causados pela pandemia da Covid-19, do valor do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) cobrado pela Prefeitura do Prudenshopping.
O mandado de segurança, impetrado pelo fundo de investimento imobiliário que é o atual dono do Prudenshopping, pretendia que a Justiça reconhecesse o direito líquido e certo do shopping no recálculo do valor do IPTU, da competência de março de 2020 em diante, com isenção do imposto durante o período em que o empreendimento permaneceu fechado, em momentos distintos entre os meses de março e julho do ano passado, em decorrência da determinação do poder público, e redução proporcional durante o período em que houver restrição ao funcionamento, desde julho de 2020 até o final da pandemia.
Além disso, o shopping ainda requereu que a Justiça permitisse que o valor recalculado fosse pago em 84 parcelas.
“O mandado de segurança mostra-se improcedente”, afirma Beraldo na sentença proferida na última terça-feira (30).
“A limitação do pleno exercício de funcionamento das lojas do shopping não afasta o direito de propriedade, mesmo porque as lojas podem, em dados momentos da normatividade a respeito da pandemia, funcionar com vendas por telefone ou on-line durante o período de fechamento”, salienta o magistrado na decisão à qual o G1 teve acesso.
“Sabido que a suspensão da exigibilidade do crédito tributário através da concessão de novo prazo para o pagamento de crédito tributário depende de ato normativo proveniente do Poder Público, pessoa jurídica de direito público competente para a instituição do IPTU, ante a indisponibilidade do crédito tributário. E a moratória tributária somente por lei pode ser concedida”, pontua Beraldo, citando o artigo 152 do Código Tributário Nacional (CTN).
“É caso, assim, de se julgar improcedente o mandado de segurança, denegando a ordem postulada”, conclui o juiz.
O G1 enviou mensagem nesta quinta-feira (1º) perguntando aos advogados Gustavo Pinheiro Guimarães Padilha e Daniela Grassi Quartucci, que assinam a autoria do mandado de segurança, se o Prudenshopping recorrerá da sentença e buscará alguma outra alternativa jurídica para o caso, mas não recebeu resposta até o momento desta publicação.
Fato gerador
No mandado de segurança, o fundo de investimento imobiliário que administra o Prudenshopping pontuou que o Estado de São Paulo instituiu a quarentena e, através do decreto nº 64.881/2020, determinou o fechamento dos shoppings centers, decisão esta reafirmada pela Prefeitura, por meio do decreto nº 30.747/2020, mas não deixando, porém, de exigir o pagamento do IPTU, vencido nos meses de março de 2020 em diante, com aplicação de juros e multa, bem como os vincendos, todos em sua totalidade, mesmo inexistindo o fato gerador ensejador do imposto.
Além disso, também alegou que, quando o próprio poder público não permite que a função social de determinada propriedade seja plenamente satisfeita, como é o caso da situação do Prudenshopping, faz cessar o fato gerador do IPTU.
Já a Prefeitura de Presidente Prudente sustentou à Justiça que a suspensão temporária de atividade não altera a propriedade do imóvel, pelo que se mantém o fato gerador.
Função social da propriedade
“Para que possa desenvolver regularmente suas atividades no município, o Shopping precisa comprovar mensalmente que se encontra em dia com as suas obrigações tributárias municipais, ou seja, precisa estar com a sua inscrição municipal válida, bem como não pode apresentar nenhum débito pendente, sob pena de não conseguir exercer plenamente sua atividade econômica”, argumenta o mandado de segurança.
Como consequência da gravidade do surto que assola o país (em termos sociais, econômicos e políticos), o fechamento obrigatório de estabelecimentos comerciais afeta diretamente a atividade econômica do Prudenshopping, prossegue o documento.
O fundo responsável pelo shopping salienta que a Prefeitura não se absteve de exigir o pagamento do IPTU, vencido nos meses de março de 2020 em diante, com aplicação de juros e multa, bem como os vincendos, todos em sua totalidade, mesmo inexistindo o fato gerador ensejador do imposto.
Ainda segundo a argumentação formulada pelo fundo de investimento imobiliário à Justiça, o mandado de segurança não faz um pedido de moratória ou mesmo concessão de isenção tributária por via paralela à prevista na legislação.
O próprio fundo ressalta que os referidos benefícios só podem ser concedidos por lei específica, como prevê o CTN, e esclarece não pretender “que o Poder Judiciário faça as vezes de legislador positivo, para lhe outorgar algo não disposto no ordenamento”.
“O que se pretende, em verdade, é demonstrar a insubsistência do lançamento do IPTU do exercício 2020, em relação aos critérios básicos dos requisitos da propriedade e da formação do valor venal do imóvel, que evidentemente se deteriorou ante a determinação de interrupção das suas atividades econômicas”, apontam os advogados Gustavo Pinheiro Guimarães Padilha e Daniela Grassi Quartucci, que assinam a petição inicial.
“O IPTU está intimamente ligado à função social da propriedade, dado a natureza jurídica da exação, que tem como fato gerador a propriedade. A sua noção passa por legislações históricas como o Código de Hamurabi, o Direito Romano, o Código Napoleônico, chegando até as legislações mais recentes”, prosseguem.
Eles acrescentam que “o fato gerador do IPTU é a propriedade, de forma que ao lado do objetivo de financiar genericamente as atividades estatais, inerentes a todos os impostos; a função social constitui também uma de suas finalidades”.
“Quando o próprio poder público não permite que a função social de determinada propriedade seja plenamente satisfeita, como é o caso do presente momento, não estaríamos diante de uma exclusão do próprio fato gerador do IPTU, que é a propriedade?”, pontuam os advogados.
“A função social da propriedade do Shopping é, antes de mais nada, a de promover empregos, entretenimento, bem-estar e comodidade para a população geral do local onde ele opera. Quando essa função não é atingida por determinação compulsória da Administração Pública – em que pese o fato atual de risco sanitário, o próprio município deve reconhecer que não ocorre o fato gerador do imposto que recai sobre essa propriedade que não possui mais nenhuma utilidade social para seu proprietário”, salienta o mandado de segurança.
Segundo os advogados, com a aniquilação do conteúdo econômico do direito de propriedade do shopping, perdem-se efetivamente os poderes de proprietário sobre o imóvel.
“Sendo assim é claramente contraditório exigir o pagamento de IPTU se o Shopping não pode utilizar do bem por conta de uma restrição de 100% em sua propriedade decorrente de determinação do Poder Público”, enfatiza o mandado de segurança.
O fundo de investimento imobiliário pontua que o isolamento social imposto à sociedade afetou diretamente o shopping, que depende exclusivamente do fluxo de consumidores para o seu funcionamento, sofrendo impacto desde o início de março de 2020 na movimentação e no faturamento.
“A imposição ao Shopping, diferentemente do isolamento social determinado ao restante da população, assemelha-se a um lockdown, que é uma forma mais radical de isolamento, com limitação expressa, no caso, a determinação de fechamento”, acrescenta.
“Nessa toada, a isenção do IPTU pelo período em que o shopping ficar fechado, bem como a redução proporcional do IPTU pelo período em que houver restrição de funcionamento, com a postergação do vencimento do imposto, com abstenção da aplicação de multas, juros e prática de atos executórios são medidas de justiça e necessárias ao equilíbrio econômico”, defendem os advogados.
Eles ainda esclarecem que o objetivo do mandado de segurança é “obter ordem judicial para garantir direito líquido e certo amparado pela Constituição Federal”, afastando as consequências “ilegais” do ato praticado pela Prefeitura, ao exigir do shopping o pagamento integral do IPTU, em razão da não incidência do fato gerador do tributo, em decorrência da indisponibilidade da propriedade.
‘Crise global’
Em manifestação apresentada à Justiça, a Prefeitura de Presidente Prudente, através da secretária municipal de Finanças, Célia Marisa Molinari de Mattos, e da procuradora Renata Galindo Ortega Guimaro Abegão, defende a legalidade da cobrança do IPTU.
“Nos autos em referência, não se vislumbra nenhum ato ilegal praticado por autoridade administrativa”, sustentam.
“De fato, há uma crise global desencadeada pela pandemia do coronavírus (Covid-19). Como consequência da gravidade do surto que assola o país, o fechamento obrigatório de estabelecimentos comerciais, entre outros, afeta a atividade econômica do mundo todo, não só do Prudenshopping”, ressaltam.
“A impetrada não pode simplesmente se abster da cobrança do IPTU pelo fato de que o Prudenshopping, por determinado período, deixou de realizar suas atividades normais. Esse fato não altera a propriedade do imóvel. Portanto, há sim fato gerador, ao contrário do que a impetrante tenta fazer crer”, concluem.
“Entretanto, sob qualquer aspecto, não há que se falar em ato coator praticado pela impetrada a legitimá-la a integrar o polo passivo desta demanda. Ela apenas obedeceu os critérios e disposições legais na cobrança do IPTU”, diz a manifestação apresentada pela Prefeitura.
“Saliente-se que a impetrada não tem intenção alguma em prejudicar a impetrante. Pelo contrário, pretende movimentar a economia em nossa cidade”, esclarece.
“Ocorre que, em razão da pandemia, o Município respeitou a legislação e as restrições impostas pelo Estado, quanto ao funcionamento das atividades comerciais, o que não autoriza a impetrada de se abster na cobrança do IPTU”, continua.
A Prefeitura ainda reforça que eventual decisão favorável ao Prudenshopping “acarretará prejuízos ao Município de Presidente Prudente, implicando em expressiva redução da arrecadação tributária, a influir no cumprimento das metas governamentais, comprometendo sobremaneira os projetos nas áreas de saúde, educação e empregos, agravando-se tal situação se outros contribuintes vierem a postular a mesma prestação jurisdicional”.
Por Gelson Netto, G1 Presidente Prudente
Fonte G1.
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