Mesmo com vaga, paciente não é transferido e morre no Pronto Socorro Municipal

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Mesmo com vaga, paciente não é transferido e morre no Pronto Socorro Municipal

A falta de estrutura na saúde pública de Bataguassu impediu que Marcos Paulo Pinheiro Moreira de 35 anos lutasse pela vida. Isso porque, segundo relato da irmã de Marcos, Daiane Silva, o irmão morreu no Pronto Socorro Municipal da Santa Casa de Bataguassu, por falta de médico que o acompanhasse até Campo Grande em uma ambulância.

Marcos conseguiu vaga em um hospital da Capital às 23h do dia 07 de junho, mas por falta de um profissional de saúde para acompanha-lo, ele não foi e morreu às 4h45 do dia 08, última quarta-feira, no hospital de Bataguassu. Conforme Daiane, para família houve omissão de socorro e negligência no atendimento, já que além de não ser levado para Campo Grande, não foram feitos exames para diagnosticar a enfermidade correta do paciente.

De acordo com a irmã de Marcos, ele passou mal com vômito e diarréia na segunda feira, dia 06, e foi levado para o Pronto Socorro Municipal a noite, onde foi atendido pela médica plantonista, Milene Scatolon, que segundo ela, falou que seu irmão tinha apenas uma virose, aplicou soro e o liberou para casa. Na terça-feira (7), Marcos voltou a passar mal, e estava vomitando e com diarréia, onde chegou a desmaiar sendo levado novamente a noite para o Pronto Socorro Municipal, pelo Corpo de Bombeiros, onde deu entrada com a mesma médica de plantão, que falou que o paciente tinha uma úlcera e que iria pedir uma vaga em outros hospitais, para ele pudesse fazer uma endoscopia.

Ainda segundo Daiane, a médica em nenhum momento falou que o caso era grave ou que o paciente poderia morrer. Foi pedido vaga 1, e não vaga zero, no entanto, a vaga saiu às 23h11, mas segundo a irmã de Marcos não tinha médico para acompanha-lo, na ambulância até Campo Grande

“Quando a vaga saiu, estávamos lá no hospital e a médica entrou em contato comigo pelo WhatsApp, e disse que a vaga tinha saído mas que agora, a gente teria que correr atrás de um médico, porque não tinha profissional para ir com ele, e o Marcos não podia ir sozinho na ambulância porque era perigoso dar um parada cardíaca, e não ter ninguém para reanima-lo. Foi nos explicado que a médica que estava de sobreaviso já estava em Campo Grande com outro paciente e que a próxima entraria em plantão às 7h, e que foi tentado contato com ele mas sem sucesso”, relatou.

A irmã ainda contou que neste momento a família ficou desesperada. “No desespero, meu pai chegou a ligar e mandar mensagem para o secretário de saúde (Helder Augusto Lousa Junior), que não respondeu as tentativas de contato. A gente chegou a pedir o endereço da médica que estaria de plantão às 7h, porque nós iriamos na casa dela, mas ninguém sabia. A gente questionava a doutora Milene e ela falava que o que ela tinha que fazer pelo meu irmão ela já tinha feito, e que nós teríamos que aguardar até a manhã do dia seguinte, porque não tinha médico para acompanhar o paciente”, disse Daiane.

Diante do desespero da família, um dos administradores da Santa Casa chegou a pedir para a doutora que estava de plantão, Milene, fosse com o paciente até Campo Grande, e que ele ficava no hospital até aparecer um outro médico, no entanto segundo a irmã de Marcos, a doutora se negou a ir porque ela estaria de plantão na hemodiálise no outro dia. 

“Nossa luta continuou atrás de um médico, enquanto meu irmão estava no quarto recebendo soro. Eu pedi para a médica se podia fazer uma tomografia para termos a real situação do caso e ela me disse que no caso dele era só uma endoscopia, porque ele estaria com uma úlcera e sendo assim só poderia ser visto com uma endoscopia, que seria feita em Campo Grande. Então ficamos no Pronto Socorro Municipal até às 2h da manhã de quarta-feira (08), e nada de aparecer médico nenhum e acabamos vindo para casa, porque eles tinham fechado o hospital e apagado as luzes e no quarto com meu irmão ficou a esposa dele”, relata Daiane

Que continua “Quando foi às 4h45 meu irmão faleceu, ele estava tendo muitas crises chegando a vomitar sangue e na última não resistiu e ninguém falou mais nada com a gente. A vaga saiu. Mesmo tendo pedido vaga 1, conseguimos com ajuda de muitos amigos. O mais difícil era a vaga, mas por falta de um médico não conseguimos salvar a vida dele” lamentou.

No atestado de óbito a causa da morte de Marcos foi diagnosticado como Choque Hipovolêmico – situação de emergência decorrente da perda de grande quantidade de líquidos e sangue – Hemorragia Gastrointestinal – manifestação clínica quando há perda de sangue em qualquer ponto do tubo digestivo, esôfago, estômago, intestino delgado, intestino grosso ou canal anal – Pancreatite Crônica – uma inflamação progressiva do pâncreas que provoca alterações permanentes no funcionamento do pâncreas – e Diabetes Mellitus – doença na qual o organismo não produz uma quantidade suficiente de insulina ou não responde normalmente à insulina, fazendo com que o nível de açúcar (glicose) no sangue fique excepcionalmente elevado.

Para Daiane um atendimento correto poderia ter salvo a vida do seu irmão “Meu irmão perdeu metade do sangue que a gente tem no corpo, devido a demora no tratamento. Porque se tivessem socorrido meu irmão com todos procedimentos, feito ultrassonografia e tomografia no abdome dele teria diagnosticado a enfermidade antes que fosse tarde demais. Ele passou mal na segunda e no Pronto Socorro só foi colhido exames de sangue. Se ali já tivesse visto que era grave e não uma virose como a médica disse e o encaminhado para um atendimento especializado, meu irmão estaria vivo”

Quem será o próximo?

Marcos Paulo Pinheiro Moreira era casado e tinha uma filha de 10 anos, trabalhava e era muito carinhoso e amado pela família, como relata Daiane. 

“Nada que for feito, vai trazer ele de volta, mas queremos que seja feito justiça, para que outras pessoas não passem pelo o que a gente está passando. Que tenha médico no Pronto Socorro Municipal, porque não foi só o meu irmão. Quantas vidas mais temos que perder para que algo seja feito? Ele não foi o primeiro que morreu por negligência e por falta de médico. O que todos queremos e que não aconteça de novo”, lamenta Daiane

Em tom de revolta a irmã de Marcos Desabafa.

“Ontem foi meu irmão e amanhã que é o próximo? A gente tem que estar esperando isso? Quem é próximo que vai precisar de um médico e não vai ter, que vai precisar de um exame na Santa Casa e não vai fazer?”

Outro lado

Em nota, a Prefeitura de Bataguassu informou que mantém no Pronto Socorro Municipal um médico plantonista e um médico de sobreaviso para atendimento de pacientes.

“O paciente citado na matéria procurou o Pronto Socorro Municipal no dia 6 de junho, onde realizou exames laboratoriais que não apresentaram alterações severas. Ele foi prontamente atendido, medicado e orientado a retornar em caso de persistência dos sintomas. Já no dia 7 de junho, o paciente, que já possuía um quadro clínico crônico retornou ao PS já mais debilitado, onde novamente foi atendido e constatou-se a necessidade de remoção do paciente. Na data dos fatos, foi registrada outra intercorrência grave, que necessitou que o médico de sobreaviso acompanhasse um paciente infartado que foi transferido para uma outra unidade hospitalar. Desta forma, o município reitera que cumpriu com suas obrigações, não deixando de atender o paciente no que é de sua competência”, diz nota

A reportagem entrou em contato também com a médica plantonista, Milene Scatolon, que atendeu Marcos nos dias 6 e 7. Ela deu explicações sobre o caso, mas pediu que não fosse divulgados na matéria. 

Como funcionava 

O jornal também entrou em contato com a ex-secretária de saúde de Bataguassu, Maria Angélica Benetasso, que informou que durante o período da sua gestão (8 anos), o município contava com no mínimo dois profissionais de sobreaviso para remoções de pacientes, tendo casos de até 3 médicos, durante os finais de semana e feriados. Na escala geral, o município contava com até 7 médicos, para atender este tipo de serviço. 

Fonte: Cenário MS

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