Catarina e Napoleão: casal de falcões carcarás faz ninho em floreira de apartamento no 12º andar e filhotes nascem na área central de Presidente Prudente
O que começou como uma visita inusitada de um casal de carcarás se transformou em uma nova família. Quando os falcões passaram a frequentar a floreira de um apartamento no 12º andar de um prédio na área central de Presidente Prudente (SP), os médicos Ana Eugênia e Enio Perrone não imaginavam que veriam de tão perto o nascimento de três filhotes das aves de rapina.
O casal contou ao g1 que tudo começou em maio deste ano. Eles moram em um edifício localizado na Avenida Washington Luiz, uma das principais vias que cortam a cidade. A floreira fica na sacada do apartamento. As aves começaram a fazer um ninho e, de galho em galho, criaram um lar. Foi quando os donos do imóvel perceberam que a visita tinha “fixado residência”.
O convívio diário com as aves gerou “intimidade” e elas foram batizadas: Catarina, a fêmea, e Napoleão, o macho. Quando o ninho ficou pronto, a fêmea começou a botar os ovos, respectivamente, nos dias 7, 10 e 13 de agosto.
“A Catarina ficou chocando os ovos. Ela é arisca. Ficava olhando. Agora já está mais acostumada. Mas fazia um escândalo quando a gente aparecia. Nisso, o Napoleão, que fica em outro prédio, aparecia e ficava dando rasantes”, falou a médica.
Os nascimentos dos filhotes também foram escalonados. O mais velho saiu do ovo no dia 7 de setembro, o do meio no dia 10 e o caçula no dia 13.
O casal conta que o mais novo nasceu muito menor do que os irmãos. “Eles estavam três vezes maiores do que o mais novo. Quando a Catarina ia dar comida, os irmãos pegavam todo o alimento”, falou Ana Eugênia.
“Esse menor acabou não vingando e a mãe deu um fim, tirou-o do ninho. Agora, ficaram os dois que já estão grandes”, relatou o médico.
O casal de moradores tem ajudado as aves e coloca pedaços de frango e carne vermelha para a Catarina.
“Mesmo que a gente não colocasse nada, o Napoleão sempre chega com comida. Ele leva filhote de pombo, calango”, afirmou o médico. “Antes, a Catarina estranhava, mas agora até espera a comida que oferecemos. Nós sabemos que não deveríamos dar-lhes comida, mas ficamos com medo de que mais um filhote morresse por falta de alimento”, destacou Ana Eugênia.
Os donos do apartamento não têm nenhum tipo de pet de estimação atualmente e acompanhar a família agregada tem sido um divertimento para eles, os filhos e os netos.
“Foi uma surpresa e eu entendo como uma mensagem de coisa boa que está por vir. Ter sido escolhido para ajudar e ver de perto a preservação da espécie é muito interessante”, afirmou Enio, que também é vereador em Presidente Prudente pelo DEM.
Como os filhotes estão crescendo, a floreira ganhou uma tela ao redor para que não haja risco de queda das aves. “Eles vão crescer mais, as penas vão surgir. Quando forem embora, eu acho que vou sentir falta”, salientou a médica.
Ninho em local seguro
O biólogo Luiz Waldemar de Oliveira explicou ao g1 que toda ave vai procurar o local que julgar seguro para fazer o ninho. “A fêmea vai procurar um local onde não vai ter interferência em período de choca, seguro. Essa espécie, geralmente, procura locais bem altos e protegidos”, disse. Isso explicaria a preferência pela floreira no 12º andar.
Sobre o intervalo de postura dos ovos, ele também disse que é o que ocorre, e a morte do terceiro filhote também é bem comum.
“Geralmente, os que nascem por último tendem a não conseguir se alimentar corretamente. Nesse caso, havia dois antes do caçula, que já foram sendo alimentados”, afirmou.
Como as aves crescem rapidamente nessa fase, os dois primeiros se desenvolveram bem mais do que o último. “Fora isso, a lei da natureza é a competição. A gente pensa que é a competição entre as espécies, mas isso já começa no ninho”, comentou.
Oliveira destacou que a postura de três ovos também é uma estratégia de reprodução. “Há a possibilidade de algum ovo quebrar, de vir um predador. Por isso, tem mais de um ovo”, exemplificou.
Sobre a alimentação que o casal Perrone tem dado aos falcões, o biólogo enfatizou que não é o procedimento correto, já que na natureza não ocorre dessa forma. Contudo, isso é uma forma de suplementar a alimentação e ajudar no desenvolvimento dos filhotes.
“Não é correto alimentar um animal silvestre. Mas isso acaba beneficiando. O problema que pode causar é o de os filhotes ficarem acostumados com esse tipo de alimento e demorarem um pouco mais para aprender a caçar e a procurar comida. Se a gente pensar pelo lado que está ajudando na preservação da espécie, faria o mesmo”, argumentou.
O biólogo enfatizou que a caça feita pelo macho, que leva filhotes de pombos para o ninho dos carcarás, mostra a importância da espécie de aves de rapina em área urbana.
“A cidade tem problemas com pombos há muito tempo. Isso mostra o papel deles [falcões], como eles fazem o controle urbano. Eles [carcarás] são predadores, são carnívoros, e estão pegando os pombos”, falou.
Oliveira também destacou a atitude do casal de médicos, que teve a consciência de deixar as aves de rapina fazerem o ninho na floreira.
Outro detalhe é que o ninho no apartamento pode ser levado como exemplo para essa geração de carcarás.
“Pode ser que esses filhotes, quando adultos, façam o mesmo, ou seja, procurem o mesmo local ou algo parecido para montar um ninho também”, finalizou o biólogo.
O carcará
O carcará (Caracara plancus) é uma ave de rapina da família Falconidae e é comum em quase todo o Brasil. Eles são onívoros e se alimentam tanto de animais mortos como de bichos vivos, e de várias espécies. Suas preferências alimentares são lagartixas, cobras, anfíbios e caracóis. Costumam saquear ninhos de aves roubando filhotes de garças, colhereiros e tuiuiús.
Geralmente, as aves constroem o ninho com galhos em bainhas de folhas de palmeiras ou em outras árvores. Ovos geralmente manchados, de cor muito variável, são incubados durante o período de 28 a 32 dias, com o filhote voando no terceiro mês de vida.
Também chamado de caracará, é ave grande, chega a medir 56 centímetros e a ter 123 centímetros de envergadura. Dono de um penacho nucal, é considerado o mais inteligente entre as aves de rapina, além de ser ótimo predador (no chão e no ar).
Vive solitário, aos pares ou em grupos, e é avistado frequentemente nas estradas e queimadas, também à beira-mar. O carcará anda pelo chão como uma galinha, pulando. Segue tratores que aram os campos para comer minhocas e outros bichinhos. Por isso, se presta também ao papel de controlador de pragas.
Por Heloise Hamada, g1 Presidente Prudente
Fonte G1.
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