Caso Gabriel: Após nova decisão da Justiça, motorista acusado de arrastar cão em carro até a morte é preso em Presidente Venceslau
Prisão preventiva de Jorge Gomes foi cumprida na manhã desta quinta-feira (16). ‘É notória a crueldade dos fatos descritos na denúncia’, afirmou o juiz Deyvison Heberth dos Reis.
Após uma nova decisão da Justiça, a Polícia Civil cumpriu na manhã desta quinta-feira (16) a prisão preventiva de Jorge Gomes, motorista acusado de amarrar um cachorro ao seu carro e arrastá-lo até a morte, na Rodovia General Euclides de Oliveira Figueiredo, a Rodovia da Integração (SP-563), no mês passado, em Presidente Venceslau (SP).
Há duas semanas, na mesma decisão que havia recebido a denúncia formulada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP) contra Jorge Gomes, o juiz da 3ª Vara do Fórum da Comarca de Presidente Venceslau, Deyvison Heberth dos Reis, tinha negado a prisão preventiva do réu.
No entanto, após um recurso interposto pelo Ministério Público, o magistrado, em juízo de retratação, decretou nesta quarta-feira (15) a prisão preventiva de Jorge Gomes “para garantia da aplicação da lei penal”.
Outro lado
A reportagem solicitou um posicionamento oficial sobre o caso ao advogado Carlos Alberto Toro, que trabalha na defesa de Jorge Gomes, mas até o momento desta publicação não recebeu resposta.
‘É notória a crueldade’, afirma juiz
“A despeito do contexto inicial, em que o cachorro teria avançado contra uma criança e mordido o réu, consigno que é notória a crueldade dos fatos descritos na denúncia (arrastar o animal canino até a morte), a seriedade dos seus desdobramentos (a dona do animal, quando tomou conhecimento do ocorrido, infartou e foi socorrida ao hospital local) e a repercussão social na comarca”, pontuou o juiz na nova decisão que levou à prisão preventiva do acusado.
O magistrado também explicou os motivos que o levaram a mudar de opinião quanto à prisão preventiva.
“O acusado permaneceu em local incerto, sobrevindo representação da Autoridade Policial pela decretação de sua prisão preventiva, o que fora secundado pelo Promotor de Justiça. No entanto, o pedido foi indeferido por este juízo, pois a decretação de prisão processual sem que o acusado estivesse localizado poderia servir de estímulo à fuga, de maneira que ficaria obstada a sua citação pessoal e, então, acarretaria a citação editalícia com provável aplicação do art. 366 do Código de Processo Penal, suspendendo-se o processo e o curso do prazo prescricional, ou seja, obstando a marcha processual e a realização da justiça estatal”, ponderou.
“Ocorre que, no cenário atual, o acusado foi citado pessoalmente, possibilitando o curso do processo, sem prejuízo da reapreciação da viabilidade do decreto prisional cautelar, mesmo porque não foi encontrado em seu endereço, mas no escritório de seu advogado, tão somente quando este juízo indeferiu o pedido de prisão”, prosseguiu.
“Com efeito, malgrado a ordem constitucional vigente imponha como regra a liberdade do indivíduo, o princípio constitucional da não-culpabilidade, que decorre de norma consubstanciada no art. 5º, inciso LVII, da Constituição da República, não impede a utilização, pelo Poder Judiciário, das diversas modalidades de prisão cautelar, tendo em vista a efetividade das normas penais e processuais penais vigentes”, argumentou o magistrado.
Ele salientou que “a prisão preventiva é medida estritamente processual que poderá ser decretada pelo magistrado, ensejando a privação da liberdade do investigado, denunciado ou acusado durante o trâmite do inquérito policial ou da instrução criminal”, quando presentes os elementos constantes do artigo 312 do Código de Processo Penal (CPP), ou seja, como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova de existência do crime e indícios suficientes da autoria.
Além disso, o juiz ainda citou outro trecho do CPP que admite a decretação da prisão preventiva quando o fato envolver crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos.
No caso em análise, o réu é acusado de cometer o crime de maus-tratos previsto no artigo 32, parágrafos 1°-A e 2°, da lei federal 9.605/98, com pena privativa de liberdade de dois a cinco anos de reclusão e multa, e ainda com causa de aumento entre um sexto e um terço em decorrência da morte do animal.
“Ademais, com os elementos indiciários até então coligidos, observo que a conduta do acusado, que já se ocultou diante de uma investigação deflagrada e possível prisão com oferecimento de denúncia, é fato que, diante de uma possível condenação à pena privativa de liberdade rigorosa, mostra-se ainda maior o risco concreto de fuga durante o curso do processo e, especialmente, após o julgamento em caso de eventual procedência da pretensão acusatória”, enfatizou Deyvison Heberth dos Reis.
“Logo, mostram-se presentes, neste momento processual e considerando todo o contexto fático, o fumus comissi delicti (prova da materialidade do crime e indícios suficientes de autoria) e o periculum libertatis (necessidade de garantir a aplicação da lei penal) imprescindíveis ao decreto de prisão preventiva (arts. 312 e 313, CPP)”, apontou o magistrado.
O juiz também marcou para o dia 13 de junho, às 14h, a audiência virtual de instrução, interrogatório, debates e julgamento sobre o caso.
Relembre o caso
O acusado de ter matado o cachorro prestou depoimento à Polícia Civil no dia 25 de abril. Na ocasião, alegou que, na madrugada de 18 de abril, horas depois de o animal ter “mordido o seu filho”, de quatro anos, “ele ingeriu bebida alcoólica”.
De acordo com o Boletim de Ocorrência, registrado por um dos tutores do animal, de 64 anos, no dia 17 de abril, o rapaz estava com o filho dele na casa da família vizinha, localizada no Conjunto Habitacional Watanabe. Segundo os donos, já era de conhecimento dos moradores do bairro que o cão era arisco, motivo pelo qual reiteraram o alerta para o rapaz, já que ele estava com a criança.
Em dado momento, devido a um suposto gesto brusco do garoto, o cachorro, de raça indefinida, teria avançado na criança, momento em que o pai colocou o braço na frente e acabou sendo mordido.
À polícia, o investigado disse que o rosto e a orelha do filho ficaram machucados, e que a própria tutora do cão, Maria Magnalda, de 65 anos, havia feito um curativo no menino, depois de se oferecer para levar pai e filho até a Santa Casa de Misericórdia da cidade para receberem atendimento médico, “socorro que foi dispensado pelo homem”.
‘Não percebeu’
O relato detalhou que, tempo depois, o envolvido ainda teria levado à casa da família vizinha um saquinho contendo carne de peixe, no entanto, as polícias Civil e Militar Ambiental suspeitam que o conteúdo entregue trata-se de carne silvestre, “possivelmente de jacaré”. A reportagem o delegado Adalberto Gonini, responsável pelas investigações, disse que o material está sendo analisado pela perícia.
Já por volta das 2h30 do outro dia, após ingerir bebida alcoólica, o réu admitiu que abriu o portão da casa da frente e chamou o animal, que respondeu ao comando do conhecido e saiu para a rua. Neste momento, o rapaz teria amarrado uma corda ao pescoço do cão, o colocado dentro do carro, no banco passageiro da frente, e amarrado a outra ponta da corda no freio de mão do veículo.
A intenção dele, conforme a Polícia Civil disse, era levar o cachorro até uma área de sítio, mas, o movimento da SP-563, pela qual transitava, fez com que o motorista “não percebesse o momento em que o cão pulou pela janela do carro e ficou pendurado pela corda”. O suspeito só se deu conta de que o animal tinha morrido quando parou o veículo, na alça de acesso ao bairro Cecap, e o deixou lá.
A Polícia Militar Ambiental informou à reportagem, que o envolvido já foi multado em R$ 6 mil pelos crimes de maus-tratos e morte do cachorro.
‘Confessou e pediu perdão’
No dia seguinte ao ocorrido, a tutora notou que o animal já não estava mais no quintal. Segundo a Polícia Ambiental, ela foi até a casa de uma vizinha e, juntas, se dirigiram até a residência do rapaz, que alegou ter dado o cão para um amigo.
Questionado sobre a doação sem autorização da tutora, ele teria confessado que matou o cachorro. Conforme o boletim, a esposa do suspeito declarou que não estava em casa no dia, mas que “o esposo confessou à tutora que havia matado o cão”.
Segundo o que informou à Polícia Ambiental, o rapaz “tomou rumo ignorado e, antes de ir embora, disse que procurou um advogado, sendo que, quando fosse intimado, compareceria na delegacia”.
Ainda conforme a Polícia Ambiental, o corpo do animal foi encontrado por integrantes da ONG Adapv.
A reportagem, o delegado Sthefano Rabecini informou que a tutora do cachorro tem problemas de coração e, após o ocorrido, precisou ser hospitalizada na Santa Casa de Presidente Venceslau devido a um infarto.
‘Companheiro’
Em contato, Josiane Prates, nora da tutora, disse que a sogra foi presenteada com o cachorro pela neta, após enfrentar uma depressão motivada pela morte do filho, o sargento da Polícia Militar José Valdir de Oliveira Junior, de 37 anos, morto por tiros disparados por um homem que se passou por policial civil, na Região Metropolitana de São Paulo, em agosto de 2020.
“Ele era como um filho para ela. Sempre muito bem tratado. Até comida no garfo ela dava para ele”, lembrou.
Segundo a nora, que visitou a idosa ainda na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), para onde foi encaminhada após dar entrada no Pronto-socorro, o rapaz, com quem sempre teve uma relação amistosa, chegou a ir na casa da vizinha “para pedir perdão”. No entanto, em uma dessas ocasiões, acabou sendo expulso por ela.
Neste mesmo dia, ela teria ido a um estabelecimento comercial, onde ouviu pessoas dizerem que “o suspeito estava se gabando por ter matado o animal”. Depois disso, sofreu um infarto e precisou ficar internada.
Ainda de acordo com a nora, a idosa foi transferida para o Hospital Regional (HR), em Presidente Prudente (SP), onde fez um cateterismo.
Em nota, o hospital informou que a paciente deu entrada no Pronto-socorro da unidade às 8h24 do dia 23 de abril, “onde foi prontamente atendida pela equipe médica e multiprofissional” e, devido à estabilidade de seu quadro clínico, recebeu alta no dia 26 de abril.
Josiane Prates voltou a falar com a reportagem, dias depois, e informou que Maria Magnalda retornou a Presidente Prudente para realizar exames. O médico orientou à paciente para que fosse submetida a procedimentos de inserção de stent coronário e de pontes de safena, para melhorar o funcionamento do coração.
Fonte: G1
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